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13-06-2025 

Despesas com a realização da assembleia de credores

O artigo analisa quem responde pelo ônus dos custos para realização de assembleias na recuperação judicial (Lei 11.101/05), propondo atualização legislativa para alinhar-se ao Chapter 11 (EUA).

I - Importância prática da matéria

Em 2024, foram ajuizados 597 pedidos de recuperação judicial de sociedades empresárias de médio e grande porte, segundo dados da Serasa Experian1.

A realização da assembleia de credores de médias e megaempresas - todas, sem exceção, com dezenas/centenas/milhares de credores com sede e filiais fora do juízo do processo - acarreta vultosas despesas: se presencial, locação de espaço, por um ou mais dias, com capacidade de receber todos os credores; logística; suporte técnico; sonorização; gravação e disponibilização na rede mundial de computadores; segurança interna e externa antes, durante e após o evento; recepção, identificação e credenciamento de credores e seus representantes; acompanhamento atento e registro fidedigno das discussões, declarações de voto e dissidências, coleta de votos etc.; se virtual, plataforma confiável; suporte em tempo real; certificação dos credores e seus representantes; gravação; relatórios; criptografia etc., conforme dispõe a Recomendação CNJ nº 110/2021, a qual, embora não possua "força normativa cogente", "caráter obrigatório" (STF, MS 39.412/DF, decisão monocrática do min. Luiz Fux, j. 1/2/2024, p. DJe. 2/2/024), na prática, é aplicada sem objeção; se híbrida, a soma de ambas as hipóteses, além das despesas, também expressivas, com a contratação de assessorias especializadas no planejamento, preparo e execução dos trabalhos.

II - Legislação aplicável

A LFRE - lei 11.101/05 - reza que "as despesas com a convocação e a realização da assembleia-geral correm por conta do devedor ou da massa falida, salvo se convocada em virtude de requerimento do Comitê de Credores" (§ 3º, art. 35) ou por "credores que representem no mínimo 25% (vinte e cinco por cento) do valor total dos créditos de uma determinada classe" (§ 3º c/c. § 2º, art. 35).

A lei estabelece, ainda, ao regular a "alienação ou oneração de bens ou direitos do ativo não circulante do devedor" (art. 66, caput), que "as despesas com a convocação e a realização da assembleia-geral correrão por conta de credores" (§2º, art. 66) "que corresponderem a mais de 15 % (quinze por cento) do valor total dos créditos sujeitos à recuperação judicial" (§1º, I, art. 66), "proporcionalmente ao valor total de seus créditos" (§2º, art. 66).

III -Despesas por conta do devedor: Regra geral

Em linguagem simples e clara, infensa a discordâncias, a LFRE diz que as despesas com a convocação e a realização da assembleia de credores correm por conta do devedor quando determinadas de ofício pelo juiz (art. 36, caput) ou  requeridas pelo administrador judicial (art. 22, I, (g)), (iii) ou pelo devedor, neste caso, p. ex., para deliberar "qualquer matéria que possa afetar os interesses dos credores" (art. 35, I, (f)), tais como, cessão de unidade produtiva isolada (art. 60) antes de homologado o plano de recuperação judicial, ou se o plano não a prever.

IV - Controvérsia sobre a interpretação do § 3º do art. 36 da LFRE

Especialistas divergem, todavia, sobre quem é o responsável pelo pagamento das despesas quando a assembleia é "convocada em virtude de requerimento do comitê de credores", oupor "credores que representem no mínimo 25 % do valor total dos créditos de uma determinada classe" (parte final do § 3º do art. 36), pois:

(a) uns, sustentam que, (i) se a pedido do comitê, arcam com as despesas a totalidade dos credores na proporção de seus créditos; (ii) se a pedido de credores que "representem no mínimo 25 % do valor total dos créditos de uma determinada classe", arcam com as despesas quem requereu a convocação;

(b) outros, entendem que - em ambas as hipóteses - arcam com as despesas quem requereu a convocação.

V -Exegese da parte final do § 3º do art. 36 da LFRE

(a) Realização da assembleia a requerimento do comitê de credores

(i) Despesas por conta de credores

Requerida a convocação da assembleia pelo comitê, as despesas correm por conta dos credores que votaram a favor de sua constituição, por dois fundamentos:

1º. de acordo com o princípio da causalidade eficiente, somente os credores que votaram (isto é, os credores que foram a "causa motriz" da convocação e, em consequência, da realização do conclave), favoravelmente, à constituição do comitê devem arcar com as despesas, tal qual, segundo jurisprudência do STJ, ocorre em relação aos ônus sucumbenciais: responde pelas custas processuais e honorários de advogado aquele que deu causa à instauração do processo principal ou incidental;

2º. a solidariedade não se presume, por conseguinte, não há solidariedade entre os credores que desejaram e votaram pela constituição do comitê e os que não compareceram à assembleia, os que se abstiveram de votar e os que a ela se opuseram.  

(ii) Despesas por conta do devedor

Há situações, contudo, nas quais as despesas correm por conta do devedor não obstante o requerimento tenha sido do comitê de credores.

Eis três exemplos;

1º. se o comitê - no pleno exercício da atribuição que lhe é confiada pelo art. 27, I, (e) - requerer a convocação da assembleia para "deliberar sobre matéria que possa afetar o interesse dos credores" (art. 35, caput, e I, (f)) (p. ex., reduzir o contingente de empregados e gestores da alta administração; paralisar linha de produção de produtos obsoletos), "(...) as despesas para realização de ato previsto nesta Lei, se devidamente comprovadas e com autorização judicial anterior, serão ressarcidas atendendo às disponibilidades de caixa" do devedor, conforme estatui o art. 29;

2º. se credores, que "representem no mínimo 25 % do valor total dos créditos de uma determinada classe", requererem a convocação da assembleia (p. ex., para decidir sobre a descontinuidade de atividades sociais deficitárias; extinção de filiais não lucrativas), as despesas correm por conta do devedor, eis que ele e os credores serão beneficiados em virtude de enxugamento dos custos e despesas decorrentes dessas operações que acarretam prejuízos;

3º. se o comitê ou se credores, que representem no mínimo 25% do valor total dos créditos de uma determinada classe, requererem a convocação para "deliberar sobre a alienação de bens ou direitos do ativo não circulante não prevista no plano de recuperação judicial" (art. 35, I, (g)) (p. ex., venda de bens do ativo imobilizado imprestáveis para a continuidade dos negócios; venda de participações societárias em controladas e coligadas que não têm sinergia com o core business), as despesas correm por conta do devedor, pois a deliberação assemblear - em tese - o beneficiará e aos credores; caso haja contestação do devedor, caberá ao juiz decidir o que for no melhor  para a continuidade dos negócios, a preservação dos empregos e os interesses dos credores.

(b) Realização da assembleia a requerimento de credores em número legal

Se credores, "que representem no mínimo 25% (vinte e cinco por cento) do valor total dos créditos de uma determinada classe" (parte final do § 2º do art. 36), ou de credores, que "corresponderem a mais e 15% (quinze por cento) do valor total de créditos sujeitos à recuperação judicial" (art. 66, caput), requererem a convocação e realização da assembleia, as despesas correm por conta exclusivamente deles.

VI - Atualização da LFRE

De lege ferenda, as despesas decorrentes de requerimento do comitê de credores deveriam recair na conta do devedor porque:

(a) o comitê não age apenas em proveito dos credores - seja de uma classe, seja da universalidade de credores - (art. 26, I, (c)), mas, outrossim, em prol do devedor (art. 26, I, (a)), da fiel execução do plano de recuperação judicial (art. 26, II, (b)), do escorreito cumprimento da lei (art. 26, I, (b)), entre outras matérias;

(b) o comitê é (i) órgão da recuperação judicial; (ii) auxiliar do juiz; (iii) fiscal das atividades do devedor (art. 27, II, (b)); (iv) fiscal das atividades e das contas do administrador judicial (art. 27, I, (a)); (v) fiscal do bom andamento do processo e do cumprimento da lei (art. 27, I, (b)), entre outras atribuições;

(c) a convocação e a realização da assembleia, quando requeridas pelo comitê de credores, dependem de autorização do Poder Judiciário após passarem - obrigatoriamente - pelo crivo do devedor, do administrador judicial, de outros comitês de credores, se houver, e do Ministério Público e - facultativamente - de qualquer credor independentemente da classe à qual pertença e ao montante de seu crédito.

Como sói acontecer, o 11 USBC - Capítulo 11 do Código de Falências dos Estados Unidos - é uma fonte de inspiração para o legislador brasileiro, pois o seu § 1102 (a) (1) prevê que o "administrador de falências" dos Estados Unidos deverá nomear um comitê de credores quirografários (the United States trustee shall appoint a committe of creditors holding unsecured claims), exceto se se tratar de pequena empresa (parte inicial do § 1102 (a) (1)), ou de pequenos negócios (§§ 1181-1195), e poderá nomear, se considerar necessário, comitês adicionais de credores ou de acionistas.

Os membros dos comitês de credores quirografários são voluntários e não fazem jus a qualquer remuneração, mas podem ser reembolsados/indenizados - pelo devedor com base em determinação do tribunal - das despesas administrativas necessárias ao exercício de suas funções (§ 503 (b) (3) (F)) e dos custos com a contratação de advogados, assistentes técnicos, contadores (§ 503 (b) (4)), dependendo das circunstâncias do caso (tempo dispendido, natureza, extensão e valor dos serviços) e do resultado do "teste de contribuição substancial" para o sucesso da reorganização, rectius, benefício real e demonstrável ao patrimônio do devedor, seus credores e acionistas, o que estimula a participação dos credores no processo de reorganização da falência do devedor.

_______

1 www.istoedinheiro.com.br

 

 

Fonte: Migalhas.

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